Uma fábula da vida real
Surgido como peça teatral, Maria do Caritó fez enorme sucesso pelo país, muito por conta dos atores Lilia Cabral (Divã, 2011) e Leopoldo Pacheco (O Caseiro, 2016). E foi pelo esforço da atriz que a história agora torna-se filme.
Escrito por Newton Moreno (Amorteamo, 2015) - também autor da peça - e pelo experiente José Carvalho (Berenice Procura, 2018), Maria do Caritó é uma espécie de fábula moderna sobre a personagem que dá título ao filme. Maria do Caritó (Lilia Cabral) foi criada por seu pai (Sylvio Zilber), que fez uma promessa de que ela morreria virgem. Com o passar do tempo, Maria foi fazendo fama de santa milagreira, possibilitando que seu pai venda seu suor noturno - resultado da menopausa - como algo milagroso. A pseudo-santa não vê a hora de arranjar um amor e fica mais desesperada ao ter sua beatificação aprovada, pois, com isso passará a viver no claustro. É quando conhece a trupe circense liderada por Teodora (Juliana Carneiro da Cunha) e se apaixona pelo atirador de facas Anatoli (Gustavo Vaz).
Dirigido pelo estreante João Paulo Jabur, o filme todo mantém um clima de fábula, como em Lisbela e o Prisioneiro (Guel Arraes, 2003), Hoje é Dia de Maria e A Pedra do Reino (respectivamente, 2005 e 2007, ambas dirigidas por Luz Fernando Carvalho). É claro que se quisermos ser realistas não conseguiremos nos envolver pela história, uma vez que a igreja católica não permite que uma pessoa viva torne-se santa. Também seria difícil acreditar que uma mulher como Maria, nos dias atuais, ainda aceitaria ser virgem - mesmo estando desesperada por sua primeira noite de amor - ou mesmo acreditaria na paixão com o ator circense como uma pré-adolescente. Se o público se dispuser a mergulhar na trama, certamente vai ter momentos de diversão e emoção.
Com uma direção de arte impecável de Sérgio Silveira, o filme é todo permeado por um azul claro e tem belas imagens aéreas que, às vezes, perduram mais do que deveriam. O elenco trabalha num registro um pouco teatral, mas que combina com a proposta lúdica do filme. Leopoldo Pacheco está incrível, irreconhecível como o coronel da cidade e que quer usar da popularidade de Maria para se eleger.
Em tempos de "empoderamento feminino" em voga, a temática do filme pode incomodar algumas feministas, porém, seu desfecho interessante parece ter sido criado para amenizar essas críticas.
É um filme leve, divertido e delicioso. Merece ser visto nem que seja apenas para admirar o belíssimo trabalho do elenco e da direção de arte.