A ANTÍTESE DA PANDEMIA, QUE AFASTA PESSOAS COM O ISOLAMENTO, MAS UNE PELO LADO HUMANO
por Karina Kiss
O longa documental Vidas (In)visíveis - Um Arsenal de Esperança tem como cenário a casa que hospeda pessoas em situação de rua e que vai muito além de ser um simples albergue. É instalado na antiga hospedaria de Imigrantes na Moóca, na cidade de São Paulo.
Dirigido por Erica Bernardini, através do filme podemos conhecer os dois lados de uma história: benfeitores que acreditam e buscam um mundo melhor e do outro lado, pessoas que necessitam e aceitam essa oportunidade.
Conhecemos por meio da narrativa e cenas, um pouco sobre a tal casa que nada mais é do que a expansão de um projeto italiano. Anteriormente o espaço era um arsenal (lugar onde oficialmente se fabricam e guardam objetos militares), tornou-se posteriormente o lugar que abrigaria Imigrantes, e atualmente abriga diversos moradores em situação de rua.
O destaque vai para a qualidade da fotografia, embora em determinados momentos tenhamos a impressão de que trata-se claramente de um filme de baixo orçamento, com ruídos e tomadas excessivamente estáticas. Porém é exatamente esse o objetivo do trabalho de direção. O cenário filmico é o próprio local que acolhe essas pessoas, consequentemente, trazendo uma sensação de intimidade ao espectador.
Os moradores de rua, personagens normalmente invisíveis aos apressados transeuntes da grande São Paulo, são o verdadeiro destaque nesse documentário que nos faz prestar a devida atenção e enxergá-los de fato, por meio de entrevistas realizadas com alguns frequentadores (moradores) da casa. Embora eles saibam que estão em um momento vulnerável da vida, todos têm a esperança de melhorar, conseguir emprego, casa e uma família.
Vale ressaltar, que as filmagens foram realizadas no auge da pandemia em 2020, momento em que o medo de contrair a doença (Covid - 19), aliado ao temor em relação ao desconhecido, por vezes, estimula atitudes xenofóbicas. Porém, a crise sanitária global, por outro lado, atuou no sentido de nos fazer entender, ao menos até certo ponto, que no fundo somos todos iguais.
Em termos estruturais, o filme é mesmo bem básico: no conjunto de entrevistas, há alguns erros na captação de voz dos entrevistados, o que faz o filme parecer bem amador. No entanto, a edição, bem como o teor dos relatos, contam uma história que necessita ser ouvida, oferecendo ao espectador também a oportunidade de refletir acerca desses indivíduos marginalizados e o que a pandemia significa para eles. Como ficar em casa, se eles não têm casa? Como lavar as mãos com frequência, se eles não têm acesso à água encanada?
A reflexão é constante sobre o momento atual e possui também caráter atemporal, visto que no passado o local também já abrigou refugiados da gripe espanhola, varíola e outras doenças.
Vidas (In)visíveis faz uma interessante ponte entre o passado e o presente do lugar que, ao longo de mais de um século foi - e tem sido ainda - espaço de acolhimento e cuidado. Primeiro para os imigrantes italianos, a partir do final do século XIX, e agora para todos que queiram ou necessitem. Por este aspecto histórico, o documentário também ressalta a forte ligação cultural entre a Itália e o Brasil, assim como a ampla presença de ONGS italianas em nosso país, sendo o "Arsenal" uma delas.
O cenário e a atitudes aqui retratadas vão certamente cativar algumas pessoas e talvez levá-las a realizarem algum apoio ou, ao menos, uma maior empatia em relação a esses seres humanos esquecidos. O arsenal de guerra tornou-se agora um arsenal de paz. Uma nova forma de olhar para o outro e constatarmos que somo todos iguais.
Vidas (In)visíveis - Um Arsenal de Esperança
Está disponível no site: www.festivalcinemaitaliano.com
Os ingressos tem o valor fixo de R$ 9,90 e dão acesso a todos os filmes do festival, a partir de 08/12.
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