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MAIS FORTE QUE O MUNDO - A História de José Aldo


Dirigido por Afonso Poyart (Dois coelhos, Presságios de um Crime), o longa é a cinebiografia do lutador e ex-campeão de MMA José Aldo Júnior. E eu, como fã amador de MMA e fã confesso do trabalho do Poyart, estava bem ansioso para ver esse filme. Ansiedade essa que demorou para ser saciada, já que o filme era pra ter sido lançado ano passado, mas como toda a divulgação estava em cima do fato do Aldo ainda ser campeão invicto, foi só ele beijar a lona pela primeira vez depois de dez anos pra que o lançamento do filme fosse adiado. Tanto que outro filme do Poyart acabou sendo lançado antes , o americano Presságios de um Crime. Demorou, mas cada segundo da espera valeu à pena.


O filme já me ganhou nos primeiros segundos, onde vemos o Aldo (José Loreto) no octógono tomando porrada e beijando a lona. Caindo de cara no chão, voltando no tempo e contando toda a história do cara. E foi legal esse clichê de começar do final e voltar pro começo de tudo. Acho acertado porque todo mundo sabe que o cara foi campeão por anos e hoje não é mais.


História de campeões já estamos carecas de ver e nenhuma supera a do Rocky, convenhamos. Mas assim como o Rocky, essa é uma historia de superação e tem como um mantra, ao melhor estilo "com grandes poderes...", a frase que Aldo ouviu do seu pai em um dos momentos mais fortes de interação dos dois no filme : "O mais importante na vida é aprender a cair".


José Loreto protagonizou de forma razoável o longa. Nada muito genial, mas não deixou a desejar também. Surpreendente foi o preparo físico que ele se predispôs a encarar para dar vida ao personagem. Não só no sentido "músculos certos nos lugares certos", mas também não parecia estranho a ele dar um golpe, ou tomar um. Ponto também nesse sentido para as lutas, muito bem coreografadas e filmadas , com o destaque para a única luta que temos num octógono em que foi criada uma espécie de "grua giratória" para ficar circulando o ringue e filmando tudo em 360 graus. Estava ansioso para ver o resultado dessa engenhoca desde que li sobre ela meses atrás.


Mas voltando para as atuações. Cara, Cléo Pires mais uma vez atuando em um bom filme (vide Operações Especiais, que ela protagonizou). Considero que ela cresce cenicamente de um trabalho para outro e faz escolhas legais em sua carreira no cinema, a qual acompanho desde o filme Benjamim (de Monique Gardemberg, 2003) baseado no livro de Chico Buarque. No mínimo, acho divertidos os filmes em que ela atua. E nesse filme em questão, Cléo está super bem. A personagem é crucial para a trajetória do lutador e a atriz entregou uma atuação honesta. Nada genial, mas honesta e competente, não destoando tanto assim do seu parceiro de cena.


Mas o grande destaque mesmo - dentre o elenco - é o Jackson Antunes. O que era aquele cara em cena? Foi um puta papel e interpretado de forma gloriosa sim por esse ótimo (e mal aproveitado) ator. O personagem dele, pai do Aldo, é peça chave para a formação do lutador. Tanto pro lado bom quanto pro lado ruim. A gente vê o protagonista agindo de forma duvidosa e até moralmente erradas no inicio do filme justamente porque é uma conseqüência da criação que teve do pai que ainda o incentivava para alguns desses atos.


A gente entende realmente as motivações do personagem do Loreto tanto para o bem quanto para o mal. Pai esse que tinha um peso em cena que poucas vezes vi em filme nacional. Esse embate pai e filho são muito fortes. Amor e ódio, ódio e respeito. Tem cenas que só o olhar do Jackson Antunes vale um monólogo inteiro, esteja ele bêbado e abraçado na privada ou sóbrio e morrendo de ódio de si mesmo numa pós briga com sua esposa.


Outro embate interessante é o do personagem interpretado por Rômulo Neto, uma espécie de nêmesis do José Aldo em Manaus na sua juventude pré Rio de Janeiro/treinos/MMA. Esse nêmesis é um personagem real, que às vezes se mescla com outros em quem o protagonista desconta a raiva e ainda tem cena em que o embate entre ambos é psicológico: em uma cena linda, com fotografia impecável, o Aldo enfrenta esse cara na cabeça dele, simbolizando um exorcismo de seus demônios.


A própria caracterização do personagem do Rômulo é interessante do ponto de vista psicológico, ele não só tem uma cicatriz no mesmo lado do rosto em que o Aldo também tem a sua, como também (pode ser viagem minha, mas eu vi isso) fisicamente, as feições do ator são muito semelhantes às do Jackson Antunes. Se isso foi intencional, além da cicatriz, ao encarar o nêmesis o Aldo estava olhando para muito do que ele odiava em si e no pai.


Dá pra pirar falando desse filme, inclusive em algumas escolhas da direção: eu vi uma entrevista do Poyart onde ele fala sobre a diferença das cenas rodadas no Rio e as cenas do primeiro ato, em Manaus: Manaus é tudo é escuro, quase sujo, num tom de pesadelo, que é onde o personagem vive seus piores momentos. Quando ele vai pro Rio no segundo ato, tudo muda, o sol vem, vida vem. E é bem isso mesmo. Se for parar pra lembrar, 90% das cenas dessa primeira parte em Manaus são noturnas, são escuras e tem uma pegada forte. Todos os piores momentos ele passa sob esse clima de pesadelo. Mesmo quando volta a Manaus a gente sente que é como ter um pesadelo depois de muitas noites de sonhos bons.


Sim, assumo de novo que estava ansioso pelo filme. E mais uma vez Afonso Poyart se mostrou digno de palmas ao se provar, novamente, um mais que competente diretor de ação. E isso é algo que carece no nosso cinema nacional, seja de filmes do gênero, seja de profissionais para tal (José Padilha é exceção, Poyart também). E a sensibilidade de Poyart para saber dosar entre as cenas de ação e drama são show de bola. Tem cenas que arrancam arrepios, literalmente. Como cenas clipadas de lutas e o José Loreto e a Cléo Pires se pegando pela primeira vez. Cena bem interessante visualmente e com uma trilha sonoro gostosa. Fiquei cantando a música dessa cena o dia inteiro.

Não tem como não recomendar esse filme, que aliás, se bobear vou ver de novo. E com certeza vai pra coleção de DVD.

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