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UM CASAMENTO


A subjetividade de uma sociedade

Um Casamento de Mônica Simões constrói cinematograficamente pelo documentário a história de Maria Moniz, atriz, jornalista e mãe da cineasta. O primeiro longa-metragem em 35 anos de carreira da videomaker, fotógrafa, documentarista e artista plástica esmiúça a trajetória de uma mulher na Bahia e Rio de Janeiro ao lidar com questões vistas por uma sociedade brasileira sob o prisma do preconceito moral e machista.


Nos últimos anos, cineastas documentaristas têm explorado com mais afinco as questões da memória ao partir do micro para o macro, do privado para o público, do familiar para o social. Da reconstrução das origens individuais para o andamento de um presente agregador das questões passadas e discussões futuras. O presente é uma constante na história, foi futuro e será passado. E muitas questões existem há séculos e continuam mal resolvidas e elaboradas, seja pelo olhar desviado intencionado, seja pela má compreensão dos fatos e a prática da ação perante as problemáticas da vida.


Maria Moniz - com seus 82 anos - relembra na imagem, pela imagem, por meio de fotos, filmes caseiros e memória, o que era ser uma jovem mulher na Bahia dos anos 50, com suas vontades, relações pessoais e amizades ao esbarrar em um moral perante a mulher, em seu casamento com Ruy Simões - pai da diretora - e pela família. O filme é uma busca da diretora em construir - a partir do casamento da mãe - os momentos de sua primeira infância e os temas dessa época que perduram até hoje.

Há um prólogo, um desenvolvimento e um epílogo. Logo no prólogo, a diretora diz à mãe que resolveu não falar de antemão sobre o projeto, pois pelo fato da entrevistada ser uma atriz, ela poderia construir uma personagem em cima da intenção da obra e quebrar a naturalidade da emoção de rememoração de uma história que se mostra dolorida em suas entrelinhas, pois com a liberdade individual respeitada, os problemas poderiam ser outros, a consequência da relação poderia ser outra.


A simplicidade da complexidade humana transcorre pelo documentário no molde de aproximação com a personagem e sua visão de mundo com que o mestre Eduardo Coutinho (Jogo de Cena, 2007) trabalhava. A montagem de Jordana Berg (Últimas Conversas, 2015) - referência no documentário brasileiro - imprime seu estilo utilizado nos filmes de Coutinho e se transforma no diálogo com o material e concepção de Mônica Simões.


Da mesma maneira que o filme questiona a instituição do casamento sob o prisma de uma mulher com suas opiniões, questiona também o documentário e sua concretização. Ao mesmo tempo que acompanhamos o desenrolar da história de Maria Moniz, adentramos na produção do filme, ao ver imagens das câmeras captando a imagem da imagem, a equipe técnica trabalhando - seja o operador de áudio com seu microfone - a imagem refletida da equipe no vidro da janela e uma instrução da diretora. Uma intimidade dupla se instaura, no fazer fílmico e no desvelamento das atitudes de um ser humano. Um casamento provocativo se instaura para o futuro social e do documentário pessoal.

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