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FACES DE UMA MULHER (Orpheline)


O retrato de quantas personagens

podemos ser ao longo da vida


Em Faces de uma Mulher, o diretor Arnaud des Pallières (Michael Kohlhaas – Justiça e Honra, 2013) mais uma vez mostra sua capacidade de explorar momentos concretos da vida de uma personagem que sintetizam a potencialidade da história de um ser humano.


O cinema francês atual - em contraposição à plasticidade do cinema americano - salvo exceções, tem explorado histórias que possam parecer simples ao se ouvir dizer, mas ao se ver na tela - com boas atuações, boas direções e uma fotografia que penetra na cena para escancarar a tensão da vida -, instiga um tempo de apreciação da complexidade do banal e das idiossincrasias de cada pessoa, renova o olhar sobre as circunstâncias e consequências do mundo em que vivemos.


Karine (Adèle Haenel) está tranquila ao trabalhar como professora em uma escola primária, enquanto pensa em ter um filho com o namorado por meio de uma inseminação artificial. No entanto, a polícia bate à sua porta para prendê-la, procurando-a por um outro nome. Ao voltar em momentos chave de sua história, compreendemos que esta mulher órfã - em etapas importantes da vida - adotou outros nomes e sobreviveu a um passado de violências e abusos.

Cada momento do passado de Karine é vivido por uma atriz diferente - em uma harmonia e visceralidade das situações que ao mostrar situações de outrora - que instiga nas projeções do espectador sobre o futuro dessa personagem. Cada atuação é consistente e intrigante. Quando pequena, a personagem é interpretada por Vega Cuzytek, aos 13 anos por Solène Rigot (O Efeito Aquático, 2016), na fase dos 20 anos por Adèle Exarchopoulos (Azul é a Cor Mais Quente, 2013) e na fase adulta por Adéle Haenel.


O filme constroi sua narrativa do fim para o início, mas não com essa clareza de linearidade inversa. O roteiro de Arnaud des Pallières e Christelle Berthevas (Michael Kohlhaas – Justiça e Honra, 2013) explora múltiplas tramas de um modo diferente do que se costumar fazer, pois, em vez de serem personagens diferentes, são tempos e espaços da mesma personagem.


A montagem alterna cada época para moldar essa história, e a percepção de que cada personagem ali é a mesma só fica mais clara para o final. A riqueza da obra - em termos de linguagem - está aí, em brincar com a percepção e a certeza do espectador, independente do título e da sinopse, na pintura deste retrato de quantas personagens podemos ser ao longo da vida, e o passado enigmático só desvelado quando necessário.


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