Tensão pelo olhar infantil
Há muitas histórias fortes de pessoas em situações vivenciadas na Segunda Guerra Mundial. Uma época tensa em que ideologias ditavam atrocidades renegando a razão em relação à existência humana. O cinema busca seus enredos em diversas épocas de diversas sociedades, e esse período até hoje rende boas experiências, se bem feitas.
Onde há conflito, o ser humano mostra suas facetas. As peripécias para se manter vivo geram a empatia necessária para se acompanhar sua trajetória enquanto público cinematográfico. É complexa esta questão em relação ao seu material temático, principalmente quando se trata de uma guerra. Geralmente cria-se uma bifurcação de lados, na qual deve-se fazer uma escolha para quem torcer. Ricas são as obras que quebram este desequilíbrio e instauram dúvidas para se adentrar nas sensibilidades dos pensamentos do porquê fazem o que fazem.
A Viagem de Fanny - terceiro longa-metragem da atriz, diretora e roteirista Lola Doillon (Contre toi, 2010) - traz leveza e vivacidade para uma circunstância pesada, sem perder a atmosfera do fôlego suspenso nos momentos decisivos. Baseado no livro autobiográfico de Fanny Bem-Ami, explora acontecimentos reais vivenciados pela autora juntamente com suas irmãs ao fugirem dos soldados nazistas perseguidores de judeus.
Em quase todo o tempo acompanhamos a trajetória de um grupo de crianças judias nas mais diversas idades entre 7 e 17 anos irem de um lugar a outro pela França com o objetivo de chegarem na fronteira Suíça em busca de segurança. Cada uma com sua personalidade compõe elementos para a história se desenvolver nos seus diálogos e relações entre personagens. Elas retratam decisões adultas para a sobrevivência. Todas estão bem dirigidas e atuam com potencialidade, visceralidade e ao mesmo tempo doçura de uma inocência deslocada em um mundo rígido e ignorante pelo medo.
O que aconteceu no passado deve ser relembrado para que não se cometam os mesmos erros desmedidos e a pluralidade de pontos de vista sobre os fatos concretizadas em obras enriquece o diálogo social vindouro. O universo infantil tem muito a nos mostrar o quanto a brutalidade adulta é tola e desnecessária. Certamente, é um filme que expande seus questionamentos e atravessa o tempo do passado para a atualidade.