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RODIN (idem)


Muito Aquém de Rodin

No centenário da morte de Auguste Rodin (1840-1917) o cineasta Jacques Doillon lança a cinebiografia Rodin (2017), escrita e dirigida pelo diretor francês sobre seu compatriota escultor, optando por uma arquitetura fílmica clássica, anacrônica ao espírito moderno que o artista imprimiu em sua obra.


Ao passo que Rodin buscava novas formas - moldando argilas com a maestria de quem revolucionava o academicismo -, no filme, Doillon trabalha com o clássico verborrágico, que deixaria o cineasta François Truffault (1932 - 1984) ao menos injuriado pela ausência de ações. E também abusa das cenas de estúdio, deixando de explorar planos que valorizassem a plasticidade das obras, das modelos, do trabalho de esculpir. Na maior parte as tomadas são de plano médio com uma abordagem mais dramatúrgica do que fílmica.


Logo no início, a amante de Rodin, Camille Claudel (Izia Higelin), comenta diante da inacabada obra Porta do Inferno - sendo criada no atelier do artista em Paris - que se Dante foi um escultor de palavras em sua magistral obra, ali estava um grande escultor da matéria, da argila, comparável ao escritor florentino na criação daquele imenso portal com suas inúmeras imagens dando vida aos cânticos do romance. Faltou a Doillon a mesma perícia para esculpir o tempo na construção das imagens, assim como defendia o cineasta Andrei Tarkovski (1932 - 1986) para o cinema.

A primeira metade do filme se inicia em 1870 com a encomenda a Rodin (Vincent Lindon) da obra Porta do Inferno. Segue-se uma sequência de planos tomados à exaustão pelo relacionamento conflituoso de Rodin com Claudel, tendo à margem sua esposa Rose (Severine Caneele). Tal ênfase monotemática parece indicar para um roteiro centrado no relacionamento dos amantes. A partir do rompimento entre ambos, entretanto, o personagem Rodin se liberta daquela prisão temática e tanto a obra do artista quanto o filme ganham nova dinâmica, mas nada de excepcional. Tão somente um ganho em relação à primeira parte.


Interpretar nesse ponto uma virada da curva dramática torna-se uma consideração que coleciona uma série de objeções, para não dizer falsa. Primeiro porque - se assim for considerada - o pouco de emoção representada é de tênue crescimento, imperceptível diante de uma consequência de rompimento previsível na história.

Segundo porque uma aproximação da forma e conteúdo naquilo que se poderia apontar para a mudança criativa de Rodin - mais liberta após romper com Claudel, acompanhando a nova dinâmica dessa segunda parte - não justifica diálogos inexpressivos por mais da metade inicial do filme.


Se a conhecida dificuldade de Rodin com as palavras, retratada na história, justificasse tal pobreza na qualidade dos diálogos, não se pode afirmar o mesmo da capacidade plástica do artista que em nenhum momento é valorizada pelas imagens.


O fato é que as notícias negativas sobre a exibição do filme em maio desse ano no Festival de Cannes - com a comentada reação de jornalistas se retirando em meio à sessão -, agora se explicam pelo resultado de um filme longe de empolgar em algum sentido cinematográfico.

Fica somente a curiosidade de conhecer um pouco mais sobre um período da história desse artista notável, em especial as cenas já no final retratando o processo de criação de uma das suas obras mais polêmicas: um Balzac criado e recriado até surpreender e inovar. Algo, muito além do resultado desse filme.


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