Leitura documental de Cora Coralina
Cora Coralina foi o pseudônimo criado por Anna Lins dos Guimarães Peixoto Bretas (1889-1985) para assinar os seus escritos, já que Ana existiam várias. E é também o nome que Renato Barbieri (Araraquara – Memórias de uma cidade, 2013) escolheu para seu documentário a respeito deste ícone da cultural brasileira, uma escritora que teve uma vida repleta de realizações e que só veio a lançar seu primeiro livro com 75 anos de idade.
Inspirado no livro Raízes de Aninha, de Clóvis Brito e Rita Elisa Seda, o documentário de 75 minutos expõe o universo de Cora Coralina e suas intensas atuações na literatura, na ecologia e na sociedade, durante mais diversas fases de sua vida.
O diretor opta por dois eixos distintos da linguagem audiovisual. O primeiro com um olhar poético, de larga amplitude, traz elementos que incitam a imaginação. Sem apresentar conceitos, mas sim a obra da poeta para o espectador sentir e pensar. Assim, de início, o filme tem esta vertente artística, com imagens que ressaltam a natureza, mostrando o imaginário de uma garota do interior.
O lúdico também compõe este segmento. Com a locução dos textos líricos de Cora, em poesia e prosa, a experiência se engrandece com descrições dos locais onde viveu. Os caminhos e suas percepções.
As atrizes Beth Goulart (Vidas em Jogo, novela de 2011), Zezé Motta (Pitanga, 2016), Walderez de Barros (Dores de Amores, 2013), Tereza Seiblitz (High School Musical, 2010), Maju Souza (As Duas Irenes, 2017) e Camila Márdila (prêmio de melhor atriz de filme internacional no Sundance Festival por sua atuação em Que horas ela volta?) se revezam no papel da autora. Às vezes vestidas de preto e apenas recitando poemas. Em outros momentos - nas reconstituições de cenas - mostrando lembranças e fragmentos de histórias.
A percepção de que estamos diante de um filme, ou seja, a quebra do ritmo poético se dá no primeiro depoimento e, depois, em cada inserção de outros, já que cada um dos participantes - familiares, amigos e estudiosos - descrevem de maneira objetiva algum aspecto da vida ou da obra de Cora.
Apesar de ter publicado seu primeiro livro na fase idosa, ela inicia os seus escritos com 14 anos de idade, sendo posteriormente publicada em jornais e periódicos locais. Sua formação humanista era sólida, com grande atuação nas causas sociais.
E aí que se encontra o outro eixo apresentado por Barbieri, suas pontuações objetivas. Ele é restrito às definições e calcado no discurso, contrastando com o ritmo poético da obra de Cora, apesar de acrescentarem informações importantes.
O único depoimento que destoa dos demais é o da própria Cora, em preto e branco. Ele, associado à sua obra, conferem lastro ao documentário e já são o bastante. Aliás, força do filme está justamente aí.
O documentário foi exibido pela primeira vez no Festival Internacional de Cinema e Vídeo Ambiental (Fica) em agosto de 2015, rodou por diversos outros festivais e tem estreia comercial prevista para 14 de dezembro.