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LA CAMA (idem)


As cicatrizes deixadas pelo tempo


Para alguns, o filme de estreia da diretora argentina Monica Lairana suscitará a impressão de claustrofóbico. Para outros, intimista, uma terceira oposição possível é de lento-contemplativo, mas sem dúvida alguma o público não escapará do impacto que o primeiro bloco provoca com a nudez de um casal de idosos tentando fazer sexo.


Entre Jorge (Alejo Mango) e Mabel (Sandra Sandrine) há uma familiaridade naquela relação, porém totalmente inesperado aos nossos olhos. A realidade visceral da carne envelhecida, as marcas do tempo nas dobras, rugas, covinhas, funcionam como um tiro que penetra por nossos olhos lembrando-nos da inexorável passagem do tempo e seu produto sobre o corpo e alma.


O roteiro conta-nos sobre o último dia de união do casal na casa que compartilharam durante décadas, ao longo do qual acumularam objetos, familiaridades, diferenças, marcas indeléveis que o espectador vai descobrindo na medida em que o casal empacota os objetos, dividem entre si os pertences, preparam-se para vender e deixar o convívio em comum.


Lairana desenha um retrato cru da realidade que a passagem do tempo pode deixar em um relacionamento de longa duração. Algo que poderia ter durado para sempre nas aparências de um casal unido, emerge na tela como um relacionamento que simplesmente se esvai, evapora, com alguns sobressaltos e hesitações é certo, porém seguindo seu destino, provocando uma sensação de desconforto, tudo registrado com fotografia de tons amarelados em que a decadência é realçada e surge com um toque realista.


A diretora com seus atores comprometidos e imersos neste mundo familiar e decadente filma com maestria esses corpos desgastados, nus ou cobertos, juntos ou separados, em movimento ou estáticos, de forma a construir uma poética do lamento à passagem do tempo desperdiçado em uma narrativa sem amor, sem paixão. A quem assistir, talvez dê medo de se ver assim no futuro.


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