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A POSSESSÃO DE MARY (Mary)


Barco assombrado e furado


A Possessão de Mary causa expectativas por ser escrita pelo roteirista Anthony Jaswinsky (Águas Rasas, 2016), ter um ator como Gary Oldman (O Destino de uma Nação, 2017) liderando o elenco e um conceito interessante: família presa em um veleiro endemoniado.


Começa com o depoimento de Sarah Greer interpretada pela ótima Emily Mortimer (O Retorno de Mary Poppins, 2018), incrivelmente verossímil em todo papel que faz. Ela, junto com duas filhas, foi resgatada depois da explosão de um barco. No seu relato saberemos sobre o destino trágico da viagem da família Greer pelo Triângulo das Bermudas (assunto manjado...).


David Greer (Gary Oldman) é um empregado de uma empresa de barcos de turistas que querem ter seu próprio barco e resolve comprar o velho veleiro Mary em um leilão. Competente como sempre, esse ator consegue ganhar nossa simpatia compondo um sujeito romântico e cheio de sonhos. Mas no decorrer da história se transforma em mais um personagem estereotipado de filme de terror que, mesmo com o Belzebu em pessoa aprontando mil na sua frente, fica arrumando explicações lógicas para os acontecimentos e não resolve nada. Na cena do leilão vemos o primeiro tropeço do filme: a equipe de cenografia entregou um veleiro novo com óbvios adereços para que pareça antigo. As velas rasgadas e antigas são feitas com pano de saco de batatas que parecem obviamente falsas e resultam em uma verdadeira “vergonha alheia”. Os escorregões não terminam aí.

John resolve reformar o barco e partir com a família e dois colegas de trabalho em uma viagem inaugural pelo Caribe. A apresentação deles é feita de forma eficiente pelo diretor Michael Goi (O Mundo Sombrio de Sabrina, Netflix, 2019) e sua situação e anseios ficam muito bem explicados em poucas, mas eficientes cenas. Porém, a eficiência fica apenas nisso, pois o barco e o diretor vão perder o rumo logo depois.


Não demora para aparecerem indícios que aquele barco está com problemas que são menores do que os apresentados pela direção e roteiro. O diretor, obviamente, sabe lidar com cenas de drama e mostra ser muito limitado quando necessita lidar com ação e violência. Usa de montagem para não mostrar o que aconteceu com personagens ou soluções para lá de ingênuas que parecem sair de um desenho animado.

Nos momentos de suspense e terror se mune de todas as artimanhas mais manjadas de filmes de terror que não tem um bom material em mãos e usa e abusa daqueles sustos baratos que envolvem sempre a aparição de algo junto com um acorde alto da trilha sonora. E os piores deles, os infames sustos que estão inseridos em pesadelos ou delírios que não acrescentam nada à história.


O mesmo tratamento tosco é dado ao vilão do filme. Pouco a pouco descobrem que o veleiro tem um passado tenebroso ligado a uma certa entidade maligna da qual o roteiro não entrega nada. Apenas explicam que outras famílias que usaram aquele veleiro desapareceram. Parecem não entender que, para que o público tenha medo, é preciso entregar informações para que sofram com a antecipação do que a entidade pode fazer. Assim cada espectador cria sua própria teoria para depois ser recompensado ou surpreendido pela aparição da tal entidade sobrenatural. E esta aparece no final, na forma de uma prima caribenha daqueles fantasmas de mulheres cabeludas que povoaram os filmes japoneses das décadas passadas. Dá uns berros, faz caretas e a história termina da forma mais manjada possível. Não dá nem para entender o que ela queria.


Perderam a chance de fazer um filme claustrofóbico e aterrorizante por esquecerem de regras simples e escolherem fórmulas batidas. Acabaram entregando uma produção previsível e sem personalidade. Assistir ao vídeo do Secretário da Cultura imitando um dos mais infames nazistas da história aterroriza mais do que esse “filmeco”. Tenha muito medo disso e fuja desse barco furado que é A Possessão de Mary.



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