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BENEDETTA (idem)



VERHOEVEN: UM PROVOCADOR NATO


por Ricardo Corsetti


Desde a época em que iniciou sua carreira como diretor e roteirista com o impagável Negócios À Parte (1972), o holandês Paul Verhoeven já manifestava sua vocação para ser um provocador nato, graças à sátira corrosiva e sempre muito bem humorada aos valores típicos da sociedade pequeno-burguesa e também norte-americana.

Em seu mais recente trabalho, o ultra-polêmico Benedetta, não poderia ser diferente. A trama baseada na "história verídica" da jovem freira que dá nome ao filme tem doses cavalares de ironia e clara crítica em relação à hipocrisia, avareza, politicagem e sadismo (sim, sadismo) que sempre caracterizaram os bastidores da Igreja Católica, sendo, portanto, feita sob encomenda para escandalizar os mais convictos e sensíveis entusiastas do catolicismo (ou até do cristianismo em geral). Só para citar uma pequena amostra do que os espectadores do filme devem aguardar, basta dizer que a jovem freira, entre outros hábitos pouco usuais para uma noviça, possui uma pequena imagem de madeira da Virgem Maria, à qual utiliza para se masturbar.


Levando-se em conta que Paul Verhoeven teve o início de sua carreira - ainda na Holanda - fortemente influenciada pelo trash/exploitation, não causa surpresa aos seus autênticos fãs e conhecedores de sua obra, as claras referências ao subgênero setentista nunexploitation (caracterizado pela presença de, digamos assim, freiras endiabradas) como, por exemplo, o clássico Malabimba (Andrea Bianchi, 1979). Mas é preciso frisar que Benedetta vai muito além do "entretenimento profano" que normalmente veríamos num típico filme de "nunexploitation", pois possui um roteiro bem acima da média e produção caprichadíssima em termos de fotografia e direção de arte (cenografia e figurinos), além do ótimo elenco, é claro.



E por falar no inspiradíssimo elenco, destaque para a protagonista vivida com muita competência por Virginie Efira (Police, 2020), confirmando ser uma das melhores atrizes do cinema francês contemporâneo. A veterana atriz britânica Charlotte Rampling (Sob a Areia, 2000) também está ótima, como sempre, encarnando a gélida e cruel Madre Superiora do convento para onde Benedetta é enviada ainda criança. E, claro, não menos importante para o êxito da trama, é também fundamental a presença do experiente ator francês Lambert Wilson (Homens e Deuses, 2010) vivendo o devasso "núncio".

Paul Verhoeven já teve seus dias de glória em Hollywood na fase mais comercial de sua carreira, época em que dirigiu os clássicos absolutos Robocop (1987), O Vingador do Futuro (1990) e Instinto Selvagem (1992). Mas, graças à progressiva invasão da ditadura do politicamente correto e posterior consagração do "Lacration's World" contemporâneo, era evidente não haver mais espaço para um cineasta tão anti-convencional e provocativo no universo do cinema mainstream (destinado ao grande público), por excelência, que é o mercado norte-americano.


Por isso mesmo, nos últimos anos o diretor tem encontrado na França (berço do cinema de autor) um campo relativamente "livre" para continuar se dedicando a seus temas destruidores das grandes instituições, assim como ocorre em Benedetta.


Em suma, se prepare para ver uma deliciosa sátira a uma das mais tradicionais instituições ocidentais (a Igreja Católica), mas só um conselho: procure não levar sua mãe católica ou seu primo coroinha junto ao cinema para ver Benedetta (risos).




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