
UM DRAMA DISFARÇADO DE COMÉDIA
por Beto Besant
Cada vez mais, filmes que abordam o universo LGBTQIA+ (até que inventem mais siglas) são produzidos e exibidos, o que é fundamental para que se entenda que todos somos seres humanos iguais, independente de orientação sexual. Todos temos nossos dramas e momentos divertidos, não importando se temos preferência pelos gêneros A, B ou C. Porém, como é muito comum no cinema, a quantidade de boas produções comparada ao volume produzido, é pequena. E aqui temos um exemplar de bom filme com personagem GLBT - e não temática -, afinal, como dito acima, dor, sofrimento, prazer, são coisas da vida, estes sim formam a temática do filme.

No Ritmo da Vida conta a história do jovem Russel (Thomas Duplessie), que terminou recentemente um longo relacionamento com Justin (Andrew Bushell) e vai para a casa de sua avó Margaret (Cloris Leachman), que possui sérios problemas de saúde. A vida, inicialmente chata naquele pacato vilarejo, aos poucos vai se revelando ao jovem rapaz, que passa a - como diz o ditado - transformar o limão numa limonada. Então ele começa a se apresentar como drag queen.
Escrito e dirigido pelo estreante canadense Phil Connell, - que divide o roteiro com a jovem e também estreante Genevieve Scott -, No Ritmo da Vida é uma bela estreia, que desperta curiosidade sobre os próximos filmes do diretor. Com um roteiro bastante interessante e bem amarrado, por vezes tem uma pequena "barriga" - quando torna-se mais lento e arrastado -, porém, nada que comprometa o envolvimento do público na trama. Em certos momentos, "carrega na tinta" com o personagem da avó e, por outro lado, deixa o protagonista um pouco vago - o que dificulta o envolvimento do público para entender suas motivações -, mas, na direção, Connell consegue resolver parte dos problemas.

A atuação de Leachman - vencedora do Oscar e falecida em janeiro de 2021, prestes a completar 94 anos - é primorosa, e o diretor sabe respeitar muito seu tempo de interpretação. Cada pausa parece adquirir contornos próprios nas mãos de uma atriz tão talentosa e experiente (por sorte, a montagem respeitou isso). Um grande mérito do jovem Connell é não ser ofuscado pelo brilhantismo da veterana, uma vez que ele também consegue destaque nas cenas em que protagoniza e faz uma belíssima dupla avó + neto (as melhores cenas do filme).

Com uma direção de fotografia caprichada - mesclando azul e laranja - e uma direção de arte eficiente, No Ritmo da Vida também agrada aos olhos. O drama, erroneamente interpretado por muitos como comédia - assim como aconteceu em Priscilla, A Rainha do Deserto (Stephan Elliot, 1994) e tantos outros filmes -, tem momentos divertidos, para aliviar a tensão e não se tornar pesado demais. Também aproveita para criticar a hipocrisia que é a atual sociedade, com seus romances de fachada para se enquadrar num modelo pré-estabelecido.
Graças a filmes como No Ritmo da Vida, acredito que, em breve, não serão mais identificados como "filme GLBT", mas sim, drama, romance, comédia, seja o que for, e independente dos gêneros e orientação sexual dos personagens. Vale conferir.

BOAS IDEIAS MAL APROVEITADAS POR FALTA DE OUSADIA
por Ricardo Corsetti
Confesso não ser um grande admirador do Batman, ou mesmo de qualquer outro super-herói, para ser sincero. E, por isso mesmo, creio que o fato de não ver um filme sobre o tal homem-morcego com olhos de fã me permite isenção para analisar com a "frieza" e objetividade necessárias, um filme sobre o referido personagem.

Dito isso, o Batman de Matt Reeves (Cloverfield - O Monstro, 2008) me soa como um bom filme, mas longe de ser excepcional. Menos pretensioso e "messiânico" do que o Batman de Christopher Nolan - "Batman - O Cavaleiro das Trevas", de 2008 - e com menos charme e personalidade do que a clássica versão de Tim Burton - Batman - O Retorno, de 1992 -, o Batman de 2022 me parece um misto de filme Noir genérico (sem a coragem necessária, no entanto, para assumir a total amoralidade de todos os personagens que caracteriza o subgênero) com elementos claros de Jogos Mortais (James Wan, 2004).
Robert Pattinson (Cosmópolis, 2012) está absolutamente insosso e sem personalidade como protagonista, sendo facilmente engolido por ótimos coadjuvantes, com destaque para a bela e talentosa Zoe Kravitz (Divergente, 2014), compondo uma "Mulher-Gato" com muita personalidade e atitude. E também para John Turturro (O Grande Lebowski, 1998), vivendo um típico "Capo" ítalo-americano de primeiríssima. Colin Farrell (Tigerland, 2000), por sua vez, praticamente irreconhecível - graças à pesada maquiagem -, apresenta um "Pinguim" minimamente aceitável, com um estilo de atuação claramente calcado em Robert De Niro, mas, evidentemente, jamais o será.

Paul Dano (Pequena Miss Sunshine, 2006) também está muito bem em cena, embora seu personagem, na prática, esteja muito mais para o "Jigsaw" de "Jogos Mortais" do que para o clássico "Charada" propriamente dito.
Aliás, se a ideia era mesmo copiar tão descaradamente a estética e estilo do célebre filme de James Wan - Jogos Mortais -, conforme ocorre em diversos momentos de "Batman", melhor seria terem convidado o ótimo e experiente diretor malaio radicado nos EUA para dirigir o filme, não é mesmo?

Além disso, há alguns problemas e contradições no desenvolvimento, tanto da trama como do personagem principal. Por exemplo: o novo Batman começa o filme "porradeiro", quase tarantinesco, para, pouco tempo depois, embarcar num discurso politicamente correto do tipo "não se pode combater o mal com o próprio mal", etc. Outra ótima ideia mal aproveitada: em determinado momento da trama parece que o filme realmente vai apostar na ousada ideia de revelar o pai de Bruce Wayne como um grande canalha, fazendo a ponte, aliás, com o que ocorre em Coringa (Todd Phillips, 2019) - do mesmo estúdio -, mas o roteiro logo abandona essa ideia, deixando apenas no ar a possibilidade.
Em suma, "Batman" é um filme de boas ideias e até com certa personalidade em relação às encarnações anteriores do personagem, mas, sinceramente, faltou coragem ao diretor/corroteirista Matt Reeves, para desenvolvê-las de forma correta e verdadeiramente ousada.

DIVERTIDO E MUITO BEM REALIZADO
por Ricardo Corsetti
Produzida e dirigida pelo francês Laurent Zeitoun, mundialmente conhecido após ter produzido um dos maiores sucessos do cinema francês contemporâneo: Intocáveis (Eric Toledano, 2011). A recente animação Coração de Fogo prova ser possível realizar um ótimo filme neste formato fora do monopólio Disney/Pixar.

Divertido e comovente, Coração de Fogo tem tudo para agradar a crianças e adultos, graças à simpática e empoderada protagonista Georgia Nolan - dublada por Olivia Cooke, co-protagonista do ótimo The Sound of Metal (2019) - na versão original do filme. E, tendo como seu pai, o simpático ex-herói do Corpo de Bombeiros Shaw Nolan, dublado por Kenneth Branagh (diretor e protagonista de Morte no Nilo - 2021).
Apesar da trama relativamente simples, o que aliás é plenamente compreensível e até bem vindo - devido à necessidade de o filme ser acessível e compreensível aos pequenos espectadores -, a ótima direção e ritmo ágil de Coração de Fogo devem torná-lo bem agradável também ao público adulto.
Superação das barreiras impostas pela vida, empoderamento feminino e a importância da real amizade em nossas vidas, são temas aqui abordados de forma leve e ao mesmo tempo bastante objetiva.

A duração relativamente enxuta (1 hora e 32 minutos) também colabora para o êxito desta animação. Além, é claro, de personagens coadjuvantes carismáticos, como o motorista de carro de bombeiros que adormece no volante o tempo todo e o químico de físico avantajado que, no entanto, parece ter medo até da própria sombra, garantem a diversão.
Simpático, criativo para os padrões temáticos do desenho animado e bem dirigido, tem tudo para ser um sucesso neste verão à brasileira.









































