
QUANDO A ESTÉTICA É ABSOLUTAMENTE TUDO NUM FILME
por Ricardo Corsetti
Eu confesso ser do time que até hoje achava que o norte-americano Paul Thomas Anderson era mesmo o diretor de um único filme: o já clássico Boogie Nights - Prazer Sem Limites (1997), mas, felizmente, e para minha surpresa, Licorice Pizza - seu mais recente trabalho - me fez rever a opinião.

Pois embora a trama do filme seja bastante simples e até pueril, é justamente aí que se encontra seu mérito, bem como também na impecável composição visual em termos de fotografia e direção de arte.
Além da primorosa reconstituição de época que remete ao início dos anos 70, o trabalho de fotografia de Licorice Pizza é belíssimo, pois recompõe, com perfeição, o tom amarelado que caracterizava as produções - rodadas em película - no cinema setentista. Temos de fato a sensação de estarmos vendo um autêntico filme setentista, rodado em película, embora aqui, evidentemente, não seja o caso, pois tamanha perfeição em recompor a estética dos anos 70 se deve não apenas ao trabalho de fotografia, bem como a uma primorosa pós-produção no sentido de se "recriar" tal estética.
Foi extremamente prazeroso ver "Licorice" na tela do cinema, pois, curiosamente, ele me causou a sensação de estar em meus tempos de infância sentado na poltrona da sala de casa, vendo uma autêntica Sessão da Tarde na antiga TV Sharp dos meus pais, comendo pipoca e esperando pelos comerciais típicos da TV aberta, para poder tecer comentários sobre o filme com meu finado e saudoso pai.

E é exatamente esse o grande trunfo de "Licorice", tocar fundo o coração e a memória afetiva de quem viveu a transição dos anos 70 para os 80, vendo TV em casa, ao lado da família.
Destaque para a ótima dupla de protagonistas, constituída pelos jovens estreantes em longa-metragem, Cooper Hoffman (filho do saudoso Philip Seymour Hoffman, a propósito) e Alana Haim, atriz e vocalista da banda de pop rock Haim. Ambos são puro talento e carisma!

Por outro lado, as pequenas participações especiais de Sean Penn (Milk - A Voz da Igualdade, 2008) e Bradley Cooper (Joy - O Nome do Sucesso, 2015), embora divertidas, são esquemáticas demais e até um tanto afetadas. Obs: sim, é possível que a orientação que ambos receberam do diretor - em termos de atuação - seja justamente essa, mas, realmente não funcionou como deveria. Já o figuraça Tom Waits (Down By Law, 1986), por sua vez, funciona muito melhor com o tom afetado que sempre o caracterizou, em sua pequena, mas marcante participação na cena do bar.
Paul Thomas Anderson sempre costumou pecar pelo prolongamento desnecessário da narrativa e aqui, embora isso não chegue a verdadeiramente comprometer o resultado, há alguns poucos momentos em que as 2 horas e 17 minutos de Licorice Pizza chegam a cansar um pouquinho, mas nada que não seja facilmente compensado pelos vários outros méritos do filme, tais como a excelente trilha sonora, recheada de clássicos do southern rock, folk, country e soul music setentista.
Em suma, Licorice Pizza é um autêntico deleite para os olhos e ouvidos do espectador. Uma deliciosa Sessão da Tarde de primeiríssima!

REPETIÇÃO MEDIANA DE UMA VELHA FÓRMULA
por Ricardo Corsetti
Desde o final dos anos 60 e início dos 70, época em que filmes absolutamente icônicos - como por exemplo, O Bebê de Rosemary (Roman Polanski, 1969) e O Exorcista (William Friedkin, 1973) - trouxeram o gênero horror de volta aos holofotes do cinema mainstream (voltado ao grande público). Se, por um lado, tais filmes foram fundamentais no resgate de um gênero, pouco tempo antes visto como "menor" no universo cinematográfico, por outro, também geraram uma espécie de fórmula "imprescindível" ao êxito dos futuros filmes de horror que pretendiam dialogar com o grande público.

Não por acaso, na recente co-produção entre México, EUA e Venezuela, intitulada Exorcismo Sagrado (de Alejandro Hidalgo), a começar pela referência óbvia no título, vemos uma verdadeira seleção (para não dizer repetição) de praticamente todos os clichês institucionalizados para quem visa realizar um filme de horror "destinado ao grande público".
É preciso, porém, reconhecer o mérito do diretor venezuelano - estreante na direção de longas-metragens - no sentido de até conseguir, com razoável competência, driblar os clichês temático-narrativos ao introduzir uma bem humorada crítica ao oportunismo católico por meio da figura do padre norte-americano Peter Williams (Will Beinbrink) na forma como ele lida com a questão do exorcismo, visando fama e reconhecimento.
O único problema é que, mais adiante, o mesmo filme que a princípio se propunha a criticar/satirizar os dogmas e o oportunismo católico acaba, quase que inevitavelmente, sendo condescendente com eles e, de certo modo, até os reverenciando.

Piadas à parte, não sei até que ponto a própria origem hispânica do diretor venezuelano não acaba por gerar um misto de atração/repulsa aos dogmas católicos, obviamente presentes em sua formação como indivíduo.
Mas o que realmente importa é que, felizmente, a habilidade narrativa de Hidalgo, associada aos razoavelmente competentes efeitos especiais, bem como a duração enxuta do filme (1h38min), evitam que a recorrência a clichês, tais como os inevitáveis "jump scares" (sustos fáceis) o tornem exageradamente previsível ou mesmo cansativo.
Enquanto mero entretenimento desprovido de maiores intenções autorais ou mesmo de soar inovador, Exorcismo Sagrado cumpre bem sua função, resultando ao menos, numa boa Sessão de Tarde para adultos.

VELHA FÓRMULA QUE AINDA FUNCIONA
por Ricardo Corsetti
Nada é mais a cara dos anos 90, época do auge da carreira de Jennifer Lopez (Irresistível Paixão, 1998), aliás, do que uma boa comédia romântica. O subgênero foi tão popular (e lucrativo) no cinema norte-americano do período que chegou a influenciar, também, boa parte da produção francesa, posterior a meados dos anos 90, por exemplo.

O recente Case Comigo, estrelado e produzido pela diva pop Jennifer Lopez, não foge às regras básicas deste formato que deu tão certo, já há praticamente duas décadas anteriores à sua realização. Desilusão amorosa/posterior encontro do verdadeiro amor, personagens secundárias fofas e engraçadinhas, trilha sonora que carrega no açúcar, conclusão de que mesmo uma vida de sucesso e realizações profissionais "nada valem sem a presença de um grande amor a seu lado", etc. Todas essas regrinhas básicas deste subgênero às quais todo mundo conhece (embora elas não estejam de fato escritas em nenhum manual de roteiro), estão aqui presentes e, sabe o que é mais impressionante? Ainda funcionam muito bem!
O coprotagonista, vivido pelo eterno não-galã Owen Wilson (Meia-Noite em Paris, 2011) é super carismático, graças ao misto de timidez, inteligência e sinceridade nas atitudes e palavras que o caracterizam o tempo todo.
Jennifer Lopez, por sua vez, praticamente interpreta a si própria: uma estrela da música pop, já na casa da meia idade, plenamente realizada profissionalmente, o tempo todo bajulada por assistentes, fãs e patrocinadores, mas que, no fundo no fundo "ainda vive à espera de seu único e verdadeiro amor". E ela dá conta do recado, seja de fato atuando, seja desempenhando coreografias nos vários números musicais que permeiam o filme, onde demonstra estar ainda com um corpão de fazer inveja a muita menininha por aí...

A diretora Kat Coiro (Disque Amigas Para Matar, 2019) se mostra competente para conduzir o ritmo da trama e driblar (explorar bem) os muitos e evidentes clichês narrativos com os quais aqui necessita lidar, nos oferecendo um filme leve, descompromissado e bastante simpático.
Jennifer Lopez, evidentemente, está longe de viver o auge de sua carreira, seja como artista pop, seja como atriz, mas tem carisma suficiente para segurar a onda e até, quem sabe, gerar, enquanto produtora executiva de Case Comigo, um sucesso inesperado. Isso veremos em breve...









































