
IDEIAS DE TOLSTOI
por Cláudia Anaf
O SEGUNDO FESTIVAL DE CINEMA RUSSO, organizado pela ROSKINO e com o apoio do Ministério da Cultura da Rússia, dar-se-á de 16 de Setembro a 10 de outubro online em sessões transmitidas pela Supo Mungam Plus em parceria com SPcine Play.

Um dos filmes que compõe o festival é A História de uma Nomeação, da cineasta Avditoya Smirnova (Kokoko, 2012), diretora e roteirista inspira-se num fato real da vida de Leon Tolstói, quando o mesmo estava no exército.
Smirnova, desde a infância interessou-se por duas coisas: literatura e cinema. Adulta realizou vários filmes baseados na literatura, e a presente obra é a segunda inspirada no grande escritor russo, Tolstoi.
O drama de época, se desenrola num regimento em Tula, onde o tenente Grigory Kolosktev, imbuído de ideias avançadas para a época, estava a serviço. Ocorre um crime, e por conta disso o acusado é levado à corte marcial. O tenente pede ajuda ao Conde Tolstoi que decide proteger os inocentes.
O filme que recebeu vários prêmios na Rússia é uma história trágica, de cortar o coração, na qual as ideias de Tolstoi provocam uma reflexão sobre a complexidade das escolhas, a lealdade aos ideais e a justiça.

Os atores principais Evgeni Kharitonov (Graveyard Shift, 2018), no papel de Tolstoi, e Alexei Smirnov (Vnutri Lapennko, 2019 como Grigory, desempenham muito bem seus papéis e emocionam fortemente o espectador.
Ao que parece, A História de uma Nomeação é uma pequena joia a ser descoberta pelo espectador.
Atualizado: 13 de set. de 2021

UM CASO DE AMOR PELA INTERNET
por Alvair Silveira Torres Junior
Sheena 667, de Grigoriy Dobrygin, que será exibido no 2º Festival de Cinema Russo em São Paulo, é um drama com lances de ironia, desenvolvido durante pouco mais de 90 minutos com a releitura da temática de crise e fim de um casamento. Embora o motivo ainda seja clássico, narrando o esgarçamento do relacionamento a partir de um caso extraconjugal, a novidade introduzida e explorada por Dobrygin é que a traição não se consuma de forma carnal, mas virtualmente, a partir de um site pornográfico, em que a performer de webcam Sheena 667 (Jordan Frye) seduz e conquista o coração de Vadim (Vladimir Svirskiy), marido da jovem Olya (Yuliya Peresild).

Tudo está calmo em Vyshny Volochyok. Moradores da pacata cidade, Vadim e Olya abrem o filme com uma cena de sexo ao som da música Le Vertigo, do compositor barroco Rondeau, com a sonoridade do Cravo combinando com as batidas da cama, como que anunciando a felicidade do casal. No entanto, a tranquilidade familiar parece ser boa demais para durar.
Vadim trabalha em sua oficina de automóveis vendendo peças automotivas que ele desmonta de carros acidentados em um trecho rodoviário conhecido na região como "estrada da morte". Olya trabalha em uma agência dos correios. E eles têm um sonho: melhorar o negócio da oficina comprando um guincho na Europa a fim de rebocar por conta própria os carros, sem depender de fornecedores locais.
Porém, como bons herdeiros da tradição literária russa, os roteiristas parecem seguir a famosa frase com a qual Tolstói abre seu famoso romance de Anna Karenina: “Todas as famílias felizes são iguais. As infelizes o são cada uma à sua maneira”. Pois bem, a maneira peculiar pela qual o filme introduz a infelicidade do casal é através da Internet, fazendo uma atualização do drama universal da crise conjugal para o século XXI.
De forma fortuita, Vadim toma contato com um site de performers eróticas pela webcam e é seduzido pela virtualidade, pelo prazer virtual, sem a rotina e energia que o amor convencional vem exigir do ser. As cenas intensificam o drama, aguçando o escapismo familiar.

A estética das cenas lembra o estilo do cinema sueco de Roy Andersson (Você, os Vivos, 2009), com sua câmera estática, bem localizada, com planos medianos que retratam o mundo de Vadim, contrastando com a câmera nervosa, trêmula e de baixa definição das cenas fragmentadas representando o mundo em que Sheena vive e se apresenta ao novo amante, seduzindo-o com a visão do estrangeiro e do diferente.
Ao final volta a música barroca Le Vertigo, mas, se antes anunciava a união carnal, agora embala a separação dos sentimentos do casal, o distanciamento das almas, mesmo porque Sheena 667 ainda está distante. Eles irão se encontrar?
Um bom filme para os amantes das releituras dos motivos e temas do romance clássico.
Atualizado: 13 de set. de 2021

UM FILME SOBRE A TRISTEZA
por Jhuliano Castilho
De Volta Para Casa é um drama realizado em co-produção pelos EUA e pela Coréia do Sul, em 2019, dirigido por Wayne Wang (Family of Winners, 2017) e estrelado por Justin Chon (Blue Bayou, 2021).

O filme é baseado num ensaio do New Yorker, escrito em 1995 por Chang-Rae Lee, co-autor do roteiro em parceria com Wang. De Volta Para Casa estreou como parte integrante do Festival Internacional de Cinema de Toronto, em 2019.
O filme aborda a história do jovem escritor Chang-Rae (Justin Chon), que começa o dia cuidando sozinho de sua mãe com câncer (cena esta que dura 19 minutos, sem diálogos). Daí por diante o filme abusa de planos-sequência que mostram trivialidades, a exemplo desta cena de abertura em que o protagonista está simplesmente se arrumando e depois cozinhando para sua mãe doente. E a referida cena segue quase sem cortes, em tom imersivo. A câmera parada focando alguns pontos não habituais, gera a impressão de estarmos, nós espectadores, espiando tal cena à distância.

Enquanto ao longo de um dia, o rapaz prepara para a família um jantar tradicional do Ano Novo coreano, ao qual aprendeu com sua mãe, emoções e memórias começam a vir à tona, levando-o de volta a momentos decisivos, de quando enfrentou os planos e expectativas de seus pais.
De Volta Para Casa é um filme intenso e imersivo. Deprimente até para alguns. Traz por meio de seu silêncio e cenas longas e contemplativas, a agonia interna do protagonista, ao espectador.









































