Atualizado: 23 de jun. de 2023

UM EXEMPLO DE UM NOVO SUBGÊNERO
por Antônio de Freitas
Nessa última década, quando vimos uma enxurrada de filmes cuja produção foi facilitada pelas novas tecnologias, com as quais tiveram a chance de criarem novas obras de orçamento baixo apoiadas em boas ideias de roteiro, algumas apresentam características semelhantes entre si e isto nos leva a colocá-las em grupos que podemos chamar de subgêneros. Control – O poder da mente (James Mark, 2022) é uma delas. Criam uma história com uma ou poucas pessoas isoladas em um ambiente - onde acontece a maior parte da história - com um mistério a ser resolvido e muita tensão dramática para captar a atenção dos espectadores. Economizando nos cenários e nos atores, a produção sai barata e até muito rentável desde que a ideia seja boa. Assim fizeram com Enterrado Vivo (Rodrigo Cortés, 2010), Demônio (John Erick Dowdle, 2010) e Circle (Aaron Hann e MarioMiscione, 2015). Ali temos ambientes únicos, uma caixa enterrada no primeiro, um elevador no segundo e uma sala misteriosa no terceiro. Assim é este filme.

Sarah Mitich (Star Trek Discovery, 2017-22) interpreta - com afinco - Eileen, uma mulher que acorda desmemoriada em uma sala hermética que aparenta fazer parte de uma estrutura de alta tecnologia. Ela não sabe como chegou e por qual motivo está ali. Lhe restam apenas alguns relances de lembranças dela se divertindo com uma menina na praia. Passa para um estado histérico querendo sair da sala até que uma voz robótica manda que se acalme e cumpra uma simples tarefa. Ela olha em volta e percebe que ali tem apenas uma cadeira de metal e uma mesa de metal e vidro sobre a qual tem um lápis. A voz no sistema de som dá a ordem de mover o lápis. Ela cumpre o que lhe foi designado e desmaia sob o efeito de algo.
Eileen acorda de novo e a voz manda que ela mova o lápis na mesa. Ela tenta levantar o braço e percebe que está algemada. Neste momento começa o drama de Eileen que embarca em uma jornada de tortura psicológica com sua tarefa ficando cada vez mais difícil até o ponto de parecer impossível. E, para seu desespero, se falhar vai ter que encarar a morte de sua filha com a qual tem os flashes de lembrança na praia. A partir daí, ela vai focar em cumprir as tarefas, descobrir o que está acontecendo, encontrar sua filha e fugir dali.
James Mark, o diretor/autor deste filme tem em seu currículo como diretor uns 4 filmes obscuros, mas foi o diretor de dublês e ação de grandes produções como Scott Pilgrim Contra o Mundo (Edgar Wright, 2010), do Robocop (José Padilha, 2014) e Shazam! (David F. Sandberg, 2019). E várias séries importantes, com cenas de muita ação e acrobacias de dublês. Sabendo de um passado deste, qualquer pessoa iria imaginar que ele não iria conseguir lidar com cenas envolvendo apenas uma mulher e, posteriormente, outro personagem encerrados em uma sala hermeticamente fechada. Mas ele se sai muito bem conduzindo o aumento da tensão e desespero dos dois personagens.
Seguindo as regras desse tal subgênero - que ainda não recebeu um nome -, se vale das memórias do passado para aliviar o tédio de ficar olhando para aquela cena. Até consegue produzir um filme eficiente com surpresas, constantes que conduzem a um final muito movimentado, ainda mais recheado de reviravoltas na história em cenas repletas de ação. Estranhamente, ele escolhe um caminho mais suave onde poderia fazer um furacão de cenas de ação. Aí dá uma caída no desenvolvimento e até decepciona quem esperava um grande e explosivo final. Mas consegue elucidar o mistério do local com poucas cenas e diálogos, dando a este filme um final peculiar, bem diferente do que estamos acostumados.
Atualizado: 23 de jun. de 2023

DOÇURA E DENÚNCIA SOCIAL NA MEDIDA CERTA
por Ricardo Corsetti
A estreia do experiente e premiado diretor japonês Hirokazu Kore-eda (Assunto de Família, 2019) numa produção sul-coreana é mesmo muito interessante pois, embora mantenha o estilo característico do diretor, Broker procura também se adequar (ou até mesmo se moldar) ao moderno e pulsante estilo do cinema sul-coreano contemporâneo .

A temática envolvendo questões e conflitos familiares (bastante associada ao cinema de Kore-eda), conduzida com muita sensibilidade e até senso de humor na medida certa, felizmente, se diferencia muito da forma como um típico filme norte-americano envolvendo a temática do drama familiar, por exemplo, a abordaria. Não há excessos melodramáticos ou de sentimentalismo barato, nem atuações carregadas em busca do Oscar. Ponto para a personalidade de Kore-eda, portanto.
Aliás, por falar em atuações não carregadas, a discrição que caracteriza o tom das atuações de praticamente todo o elenco, inclusive do ótimo protagonista vivido por Song Kang Ho ("Parasita" - Bong Joon Ho, 2019), não significa que não haja emoção em suas atitudes ou diálogos, pelo contrário; apenas adequa seu tom a algo mais realista e menos afetado do que, conforme já mencionei, normalmente veríamos numa produção hollywoodiana (ou até mesmo brasileira).

O ritmo com o qual é conduzida a trama, ao longo de 2 horas e 09 minutos, às vezes torna um pouco cansativo o desenrolar da história. Mas, felizmente, o talento e experiência de Kore-eda, com um estilo caracterizado por poucos (mas precisos) movimentos de câmera e planos longos, seguram bem o desenvolvimento narrativo.
Tecnicamente bem realizado, com atuações adequadas ao estilo proposto e com um desfecho que guarda uma boa surpresa (talvez até perceptível a um olhar mais atento), Broker tem tudo para agradar ao espectador médio de cinema, ou seja, aquele que de fato ainda vai ao cinema e em busca de algo mais do que os blockbusters normalmente tem a oferecer.
Atualizado: 23 de jun. de 2023

AMOR SEM LIMITES
por Ricardo Corsetti
A conturbada relação conjugal entre o célebre compositor russo Pyotr Tchaikovsky (1840-1893) e sua esposa Antonina Miliukova (1848-1917) já havia sido retratada anteriormente em outras duas produções: no longa ficcional Delírio de Amor (Ken Russel, 1971) e também no documentário da BBC The Creation of Greatness (2007). Mas infelizmente, em ambos os casos, Antonina é vista de forma pejorativa, retratada como "louca e imprudente".

Nesse sentido, a recente produção russa A Esposa de Tchaikovsky possui, em primeiro lugar, o mérito de corrigir tal injustiça, ao retratar - de forma muito mais humana e complexa - a figura de Antonina que, aliás, era também compositora erudita.
Além de ser um filme tecnicamente irrepreensível, com belíssimo trabalho de direção de arte (cenografia e figurinos) em termos de reconstituição de época e bela fotografia também; A Esposa de Tchaikovsky corrige ainda outra grande injustiça histórica, fruto, é claro, da mentalidade e cultura vigentes naquele período: o preconceito em relação à homossexualidade de Tchaikovsky que o fez, inclusive, embarcar num casamento infeliz e de aparências, como forma de "dar uma satisfação à sociedade".

Tão relevante quanto isso é a revalorização histórica que o filme propõe em relação à Antonina Miliukova, mulher inteligente e com personalidade. E não apenas uma "louca apaixonada e imprudente", conforme as já citadas produções anteriores acerca do assunto, a tinham tratado.
O mais importante compositor russo da chamada "Era Romântica", bem como sua também talentosa e forte esposa, realmente mereciam um filme que os retratasse de forma humana e sem julgamentos morais. E felizmente, A Esposa de Tchaikovsky cumpre bem a missão.









































