
QUANDO O CARISMA DE UM ELENCO ESTÁ ACIMA DE TUDO
por Ricardo Corsetti
Ter um filme estrelado por Robert De Niro (Taxi Driver, 1976), Morgan Freeman (Um Sonho de Liberdade, 1994) e Tommy Lee Jones (Três Enterros, 2005), por si só, já é garantia de apelo junto ao grande público, sobretudo no que se refere aos espectadores acima dos 40 anos. E conforme já era de se imaginar, sem a menor dúvida, o grande destaque e ponto alto de Vigaristas em Hollywood.

Trata-se de uma simpática comédia de "humor negro", como se dizia nos velhos tempos não sujeitos ao politicamente correto (às vezes excessivo), que provavelmente não aprovaria esta classificação que, na verdade, tem a ver apenas com a ideia de um humor mais sarcástico e sem qualquer conotação racial.
Embora divertido e com alguns momentos memoráveis, Vigaristas em Hollywood corresponde aquele típico filme em que a ideia básica, a partir da qual se desenvolve, é bem melhor do que o resultado propriamente dito.
Nesse sentido, a presença de um elenco tão experiente e carismático ajuda muito a segurar o roteiro no momento em que este se rende a algumas piadas previsíveis e nem sempre tão eficientes.

Aliás, Robert De Niro e Morgan Freeman estão bem em cena, mas longe de apresentarem suas melhoras atuações, às vezes parecendo que estão atuando "no piloto automático". Tommy Lee Jones, por sua vez, é quem realmente rouba a cena ao viver um ex-astro televisivo hoje decadente e que, ainda por cima, ao tentar seu retorno triunfal via cinema, será vítima de um plano maquiavélico arquitetado pelo produtor de cinema (também decadente) vivido por De Niro e pelo mafioso vivido por Freeman.

O filme tem lá seu charme por fazer menção ao clássico universo da velha Hollywood, onde os astros de cinema eram autênticos semi-deuses e, de certo modo, se podia dizer o mesmo quanto aos produtores.
Também merece destaque a enorme quantidade de referências visuais e citações verbais a grandes clássicos da Era de Ouro em Hollywood, entre os anos 40 e até meados dos 60. Além disso, há algumas cenas envolvendo efeitos especiais (inesperados por se tratar, acima de tudo, de uma comédia) que, surpreendentemente, são tecnicamente muito bem realizadas.
É visível que, com algumas alterações de roteiro, Vigaristas em Hollywood poderia ter rendido um filme bem melhor do que agora vemos na tela. Mas a simples façanha de ter reunido, pela primeira vez, aliás, esse trio de monstros sagrados da história do cinema num mesmo filme já torna o diretor/corroteirista George Gallo (A Rosa Venenosa, 2020) digno de aplausos.

CHANCHADA À FRANCESA
por Ricardo Corsetti
Há pelo menos duas décadas, é fato que o cinema francês tem investido muito na produção de comédias de apelo popular (românticas ou de costumes), buscando assim atingir o grande público (inclusive na própria França) e deixar um pouco de lado o estigma de "cinema cabeça" e autoral. Nesse sentido, não causa espanto que até mesmo a tendência à concepção de "franquias" (produções desde o início pensadas para gerarem continuações) também já tenha chegado ao Cinema Francês dos novos tempos mercadológicos.

Que Mal Eu Fiz a Deus? 2, sequência do filme homônimo realizado em 2015, se inscreve perfeitamente nesse filão. Com um humor de apelo popular, mas ao mesmo tempo com piadas e diálogos espirituosos do tipo que dificilmente veríamos numa comédia norte-americana padrão, por exemplo, o novo filme dirigido e co-roteirizado por Philippe de Chauveron (Que Mal Eu Fiz a Deus?, 2015), diverte ao satirizar o choque cultural contemporâneo entre franceses natos e imigrantes das mais diversas origens. Pena que nem sempre acerte no tom ao satirizar tais conflitos (sobretudo verbais), em alguns momentos quase resvalando na xenofobia.
O grande destaque é mesmo o veterano ator Christian Clavier (Se Eu Fosse um Homem, 2020), divertidíssimo ao viver o patriarca de uma típica família de classe média-alta francesa tendo que rever seus medos e preconceitos em relação à presença e entrada dos "temiveis" imigrantes no interior de sua própria família.

Clavier equilibra, com seu talento, as demais atuações quase sempre um tanto exageradas e estereotipadas dos demais atores, humanizando bastante esse personagem que, nas mãos de um ator menos experiente e talentoso, poderia soar como um burguês intragável.
O personagem chinês em eterna paranoia quanto ao fato de achar que os franceses (inclusive seus amigos) o consideram uma ameaça à economia francesa é também bem divertido. Ao passo que o imigrante/refugiado afegão que acaba indo viver na casa do já citado personagem vivido por Christian Clavier, caso melhor desenvolvido e menos estereotipado, poderia render algo bem melhor, mas as situações que ele ali enfrenta beiram mesmo a xenofobia e eurocentrismo explícitos.
Entre erros e acertos, Que Mal Eu Fiz a Deus? 2 diverte e retrata de forma bem-humorada as agruras vividas por imigrantes de origem árabe, chinesa, africana, etc; em território francês. Faltou apenas desenvolver um pouco melhor os personagens e evitar tantos clichês. Mas é realmente válido ver essa busca por um humor de apelo popular por parte do antes cerebral e sisudo cinema francês.

O NÃO TÃO DISCRETO CHARME DA BURGUESIA
por Ricardo Corsetti
Fico realmente feliz ao ver que, aparentemente, o grande Ridley Scott (Alien - O Oitavo Passageiro, 1979) recuperou a velha forma em seu mais recente trabalho Casa Gucci.
Apesar da longa duração (2 horas e 38 minutos), o filme não chega a cansar em nenhum momento, graças ao indiscutível talento narrativo de Mr. Scott e também a um senso de humor bem peculiar, quase pastelão (mas sem excessos) que percorre toda a trama.

A saga da lendária família italiana, criadora de um autêntico império no ramo da moda, revela porém, aquilo que, no fundo, qualquer pessoa razoavelmente inteligente e bem informada já sabe: não se constrói um império sem que os envolvidos em sua construção, em algum momento sujem as mãos, os pés e tudo o mais, no decorrer dessa escalada rumo ao "topo".
O elenco super talentoso, onde inclusive Lady Gaga está muito bem (ao contrário do que vimos em sua estreia como protagonista em Nasce Uma Estrela, 2018), sem sombra de dúvida colabora para o êxito do filme. Jared Leto (Réquiem Para Um Sonho, 2000) também merece destaque, pois está divertidíssimo (apesar de exagerar um pouco no tom cômico em alguns momentos) na pele do filho paspalho de Aldo Gucci (Al Pacino). E, claro, o sempre aristocrático Jeremy Irons (O Reverso da Fortuna, 1990) também está ótimo como o patriarca supremo desta autêntica dinastia toscana.

Talvez a atuação menos inspirada seja justamente a do protagonista Maurizio Gucci, vivido pelo "falso galã" Adam Driver (O Homem Que Matou Dom Quixote, 2019), mas é possível que o ator tenha optado por esse tom mais "morno" de atuação, justamente buscando retratar a timidez e a personalidade aparentemente contida de Maurizio, em oposição a alguns de seus espalhafatosos familiares como o tio Aldo Gucci, impagavelmente interpretado por Al Pacino (O Advogado do Diabo, 1997).

Em termos técnicos, sobretudo no que se refere à direção de arte (cenografia e figurinos), me parece até meio óbvio que Casa Gucci dispensa maiores comentários nesse sentido, sendo um autêntico deslumbre em termos estéticos, retratando muito bem, inclusive, a reconstituição de época de meados dos anos 70 e início dos 80, época em que se passa boa parte da trama.
Quando se pensa na extensa e já clássica obra cinematográfica de Ridley Scott, Casa Gucci pode até não ser necessariamente um de seus melhores trabalhos, mas, sem dúvida, já é bem superior a qualquer coisa que diretores mais jovens e badalados pela crítica e público contemporâneo, como um Christopher Nolan (Tenet, 2020) ou Wes Anderson (A Crônica Francesa, 2021) nos apresentaram nos últimos anos.









































